quinta-feira, 15 de julho de 2010

Amigo de Deus






2.1. SEGUNDO A BÍBLIA O QUE DEUS NOS FALA SOBRE A ORAÇÃO?
Na perspectiva do Antigo Testamento, segundo o Catecismo da Igreja, a
oração é vista, nas primeiras passagens bíblicas, como um modo concreto e bonito de
relacionamento com Deus que se mostra mediante a apresentação de oferendas a Deus, ou pela
invocação do nome de Deus, ou ainda como uma caminhada com Deus. À luz dos relatos
bíblicos, que nos narram diversas experiências espirituais dos grandes homens de Deus,
encontraremos várias noções que nos levam a entender o que seja a oração. No chamamento de
Abraão e na sua resposta a Deus, a oração se expressa como uma escuta atenta e silenciosa do
coração à voz de Deus e como uma resposta concreta na obediência a Ele, (obediência significa
em latim, ouvir com atenção), buscando realizar a vontade de Deus, por meio de ações
concretas, e que por sua vez requer como fundamento único o dom da fé na fidelidade de Deus.
“A oração restaura o homem a semelhança de Deus e o faz participar do poder do amor de Deus
que salva a multidão”. Na experiência de Jacó a oração pode ser definida como o combate da fé
e como a vitória da perseverança. Na profunda experiência de Moisés a oração revela sua
dimensão de intercessão, de diálogo com Deus, que por primeiro vem ao seu encontro,
revelando sua mais bela face, a da contemplação, pois Moisés falava com Deus face a face.
Neste âmbito a oração se apresenta como um encontro íntimo com Deus. Por sua vez em Davi a
oração adquire um rosto novo, de louvor e ação de graças, expressando sua adesão fiel, sua
confiança e alegria no Senhor. Já na experiência espiritual dos Profetas a oração é revelada
como uma escuta e fidelidade a Palavra de Deus, que impulsiona as específicas missões de falar
em nome de Deus. E os salmos são a própria Palavra de Deus que se faz oração, pessoal e
comunitária, ensinando-nos a orar sempre, em todas as circunstâncias da vida, se caracterizando
pela simplicidade e espontaneidade num contínuo desejo de Deus, aqui a oração reflete a
vivência da fé nos diversos acontecimentos da nossa vida.
Na perspectiva do Novo Testamento, com a manifestação do Filho de Deus, a
oração encontra sua plena revelação em Jesus, que reza com seu coração humano, sendo um
coração de Filho. Desse modo a oração possui uma novidade: a oração se manifesta como
oração filial, como um encontro com o Pai. Jesus sendo um homem de oração nos mostra toda a
força da oração, e sua importância na vida humana e nos seus momentos decisivos
configurando-se segundo o testemunho de Jesus: como uma entrega humilde e confiante a
vontade amorosa do Pai, como uma adesão amorosa do coração ao mistério da vontade do Pai,
como uma ação de graças, que deve vir por primeiro.
Nos Evangelhos Jesus deixa seu ensinamento sobre a oração, que deve ser
assim compreendida: como um encontro filial com o Pai, movido pelo Espírito Santo, que nasce
de um coração humilde e reconciliado com todos, fruto de uma fé viva, e em constante
vigilância. A oração, em sua própria essência, requer algumas propriedades: primeiro a
persistência; depois a paciência e por fim a humildade. A grande novidade que Jesus nos traz,
mediante a sua encarnação, é esta: a oração dos discípulos deve ser feita, “em seu Nome”, pois
Ele é o caminho, a verdade e a vida, nosso Intercessor diante do Pai. E por fim no Magnificat
aprendemos de Maria qual a finalidade última da oração cristã: a união com Deus, nossa
comunhão com Ele, “ser todo dele porque Ele é todo nosso”.
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2.2. COMO PREPARAR PARA A ORAÇÃO?
Para uma boa oração necessitamos estar atentos para algumas condições
prévias que nos ajudam a viver a oração como uma experiência de encontro com Deus, ou seja,
para uma oração profunda e verdadeira necessitamos de uma preparação, que servirá de apoio e
ajuda para que a oração flua em intimidade e profundidade.
a. Disposição interior: vai-se para a oração não apenas para cumprir um dever ou para encarar
algo difícil ou inútil, mas para dialogar com o Pai, para um encontro de amor, procurando
ouvir o Espírito Santo e aprender com Ele; por isso a primeira exigência é entrar num clima
de oração, com um coração que tenha desejo de Deus e de sua Palavra.
b. Escolher um bom lugar, onde possa rezar melhor, que ajude a viver o clima de oração:
assim como Jesus se retirava para lugares específicos como o deserto, a montanha, também
nós precisamos ficar a sós com Deus, e o lugar deve ser propício para isso.
c. Tempo: É indispensável se preparar para a oração definindo um horário do dia que seja
mais favorável a sua oração, fixando um tempo determinado para isso, e procurando ser fiel
a Ele, pois Jesus se levantava de madrugada para rezar, e passava mesmo a noite inteira em
oração ( Lc 6, 12; Mc 1, 35 ).
d. Posição do corpo: Encontrar a uma boa posição física, o que não significa a mais cômoda,
que facilite a concentração e possibilite que a oração flua com naturalidade, evitando assim
que se perca o foco e o ritmo da oração.
e. Serenidade Interior: Quando se está agitado emocionalmente e com um coração inquieto e
perturbado a oração encontrará maior dificuldade de acontecer com fluidez e profundidade,
por isso se requer dispor o coração na paz, acalmar as paixões, esvaziar-se das preocupações
da vida, entregando-se pela fé ao Senhor Jesus e clamando a graça do Espírito Santo para o
apaziguamento do coração.
f. Silêncio Exterior: Em meio a tanto barulho, que muitas vezes independe de nossa vontade,
sendo externo a nós, requer uma capacidade interior de desligar-se, evitando prestar atenção
ao barulho, não se incomodando com ele, mudando o foco de sua atenção para o que se está
disposto a vivenciar naquele momento da oração, como nos diz frei Clodovis : o ruído já não
mais incomoda por dentro, embora persista por fora.
g. Silêncio Interior: Aqui se deve buscar o recolhimento, como encontro consigo mesmo,
visando voltar-se para si mesmo, livrando-se do que possa tirar o foco do diálogo com Deus,
não mais daquilo que é exterior, mas agora das agitações interiores. “Pois como Deus poderá
preencher seu coração com sua presença, se você está entulhado de tantas coisas”. Só uma
mente recolhida e tranqüila dialoga com Deus, assim é preciso esvaziar a cabeça,
tranqüilizar o coração, focar-se em Deus.
h. Dar-se conta do valor e da importância da Oração: Eis um princípio básico para começar
e perseverar na oração, reconhecendo que isto é fundamental para minha vida, assim como o
ar que eu respiro. Não se faz aquilo que não se julga importante. Por isso devo antes de tudo
tomar consciência daquilo que vou fazer quando estou a orar: vou realizar para um encontro
de fé com o Pai, que me atrai ao seu amor, mesmo quando eu não venho a sentir esse amor,
mas poderei perceber que isso é verdade; e que o mais importante é: unir-me a Deus, pois
esta é a finalidade da oração, independente se sinto sua presença ou não.
i. Pedir a presença do Espírito Santo: Esta exigência é peculiar a longa tradição da Igreja,
uma vez que o Espírito é o doce hóspede da alma e o nosso Mestre Interior, somente sob sua
moção podemos viver bem nossa oração pessoal, sendo por ele iluminado neste desejo de
profunda união com nosso Salvador e Senhor Jesus Cristo.
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2.3. QUAIS OS BENEFÍCIOS E EFEITOS DA ORAÇÃO?
A oração pessoal possibilita aquele que reza com fé e com perseverança, pois
neste assunto não há imediatismo nem mágicas, e para tanto requer persistência e fidelidade,
angariar no âmbito humano, como nos ensina frei Clodovis, quem reza e medita adquire uma
identidade mais sólida. Ganha em auto-realização, vê mais sentido nas coisas, percebe mais
encanto em seu mundo, sente-se mais cheio de serenidade, equilíbrio e felicidade interior, cresce
sua sensibilidade aos valores profundos da vida, e mais ainda, a oração ajuda a recuperar a
saúde, protege contra a perda da harmonia interior, propiciando autocontrole e serenidade do
coração, e permite enfrentar os problemas da vida com melhores chances de sucesso.
Por sua vez no âmbito espiritual a oração gera uma confiança filial em Deus,
de quem tudo recebemos, nos impulsiona a uma fé mais viva, ao mesmo tempo que dela
procede, fortalece nossa vontade na busca pela santidade de vida, nos leva a uma experiência
mais profunda do amor de Deus, faz iniciar em nós um processo contínuo de cura interior, assim
como vai sedimentando em nosso coração as virtudes cristãs, e opera a libertação interior dos
vícios e de seu enraizamento em nossas estruturas humanas. Uma vez que não podemos dizer
Jesus é o Senhor senão pela moção do Espírito Santo, como nos ensina o Catecismo: “cada vez
que começamos a orar a Jesus é o Espírito Santo que, por sua graça preveniente, nos atrai ao
caminho da oração”, assim sendo, o Espírito Santo é o nosso Mestre interior que move nossa
oração, que derramado aumenta em nós os seus dons. E desejamos acrescentar o fruto por
excelência da oração cristã que nos faz experienciar a graça da salvação que Jesus veio trazer a
todos os que nEle crer, pois quem nele crê possui a vida eterna.
2.4. QUAIS OS PREJUÍZOS QUANDO NÃO SE TEM A ORAÇÃO PESSOAL?
Por conseguinte aquele que não reza se priva de todos esses benefícios
espirituais e humanos. Uma vez que a oração nos leva a um encontro com Deus e consigo
mesmo, quem não encontra a Deus também acaba por perder a si mesmo. A falta de oração
deixa o coração fragilizado diante das angústias e problemas da vida. No livro de Jó temos um
testemunho de como a oração é fonte de fortaleza da alma e de firmeza da fé diante das diversas
tragédias que podem acontecer nesta vida. Sem a oração o homem perde o sentido maior desta
vida, e de sua transcendência na direção de Deus. Uma vez que orar é sempre possível, aquele
que não reza perde a oportunidade de direcionar sua vida e os acontecimentos a sua volta,
mesmo os mais trágicos, para Deus e nEle viver a dimensão da aceitação, mesmo quando não é
possível compreende-los. A falta de oração enfraquece a alma humana, e a pessoa que deixa de
rezar se torna mais sujeita a perder o auto-domínio de si mesmo e de seus impulsos, assim quem
não ora se torna mais propenso ao pecado. É muito clara a exortação do Catecismo nº. 2774: “Se
não nos deixarmos levar pelo Espírito, cairemos de novo na escravidão do pecado”. Aquele que
não possui uma vida de oração pessoal certamente se torna mais aberto às seduções desse
mundo e às tentações do mal. Como nos diz Santo Afonso Maria de Ligório: “Quem reza
certamente se salva; quem não reza certamente se condena”. E São João Crisóstomo nos ensina
algo similar: “É impossível que caia em pecado o homem que reza”, o que equivale a dizer que
quem não reza facilmente acabará pecando.
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2.5. COMO DEVE SER A ORAÇÃO PESSOAL?
A oração pessoal deve antes de tudo ser pessoal, onde cada pessoa encontrará
seu próprio caminho na oração sendo guiado pelo Espírito Santo e norteado pelos ensinamentos
profundos que a Igreja nos deixou em sua riquíssima Tradição, a partir das diversas experiências
dos grandes santos e santas da Igreja. Cada um deve encontrar seu método de Oração Pessoal, e
a forma de oração pelo qual vai se identificando, passando pela Oração Vocal, de louvor e de
intercessão, adentrando nos esquemas místicos da meditação e da contemplação, como oração
mental, e perpassando pela Lectio Divina, leitura orante da Bíblia, ou pela Oração dos Salmos,
Liturgia das Horas, ou ainda pela Oração do Santo Terço, como devoção mariana, ou passando
pela invocação do nome de Jesus, mediante diversas jaculatórias, sendo que todas elas devem
convergir para o sentido último de nossa vida: a adoração.
O importante é encontrar-se naquela forma de oração que mais o identifica
com sua realidade existencial e com seus desejos espirituais de encontro com Deus; assim como
deve se priorizar antes de tudo a fidelidade à oração pessoal, na busca da união com Deus, e não
simplesmente de sentir a Deus, pois sentir Deus não depende de nós, isto é graça, dom gratuito,
que Deus concede a quem quiser e quando desejar, mas o buscar a Deus, isso depende da minha
vontade. “Contudo o sentir Deus não é ainda o principal na vida espiritual. O principal está em
querer a Deus por si mesmo. Pois o sentir Deus não está sempre ao nosso alcance, enquanto o
querer Deus sim”, nos alerta frei Clodovis.
A oração pessoal deve concretizar o pedido de Jesus: “Orai sem cessar”, em
todas as circunstâncias da vida, o que equivale a dizer que todas as circunstâncias, todos os
acontecimentos são meios pelos quais podemos fazê-los oração, aqui vida e oração se
encontram, ambas se cruzam, a vida se faz oração, e oração se faz nossa vida. Adorar a Deus em
espírito e em verdade, este é o ideal proposto por Jesus. Comentando esta passagem Monsenhor
Jonas Abib ensinava que esta adoração a Deus dever ser feita no Espírito, que clama em nós
Abba Pai, e em verdade, na verdade de nossa vida, com tudo aquilo que estamos passando em
nossa realidade existencial e espiritual, do contrário nossa oração corre o risco de ser mentirosa.
A oração pessoal deve ser fruto do nosso amor a Deus, pois onde o não há
amor tudo se torna insignificante, já nos dizia Santa Terezinha: Nada é pequeno onde o amor é
grande, como também deve ser expressão de um compromisso de vida, algo de fato vital para
nós, sem a qual a vida perde sentido, uma vez que sem esse comprometimento com Deus e
fidelidade perseverante à oração pessoal corremos o risco de um não progredir na fé, de
paralisar nosso crescimento espiritual, e assim não chegarmos à plena estatura do Cristo, como
meta de toda vida cristã, segundo nos propõe São Paulo.

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